sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Não quero ser amorfo.

o sol de uma manha retinando
o peito
de um calor maduro
com uma vida que pulsa
coração aberto
brilho avermelhado

não há fruto que boca nao coma
nem paloma que asa nao voe

por mais que me esforçe
em passar os dedos magrelos
nessas letras ladrilhadas


nao faz o seu sorriso

me descegue mornamente

para que eu possa rasgar
seus lábios, sua pele

liso, livre
como o mar
escorrido do verão.

me faça de amor

pobre das palavras

não

domingo, 20 de dezembro de 2009

A morte do capitão

Tinha uma praia e logo na beirada
algumas casinhas
rendeiras
pescadores
passeio de bateras
mergulhos de criança
vento sul

As casinhas dobraram uma geração
e logo pessoas de lugares longinquos
começaram a chegar
e tinham que comer e tinham que dormir
e tinham que viver como quem ali vivia

Mais uma geração
e existem hotéis, restaurantes
onde a moqueca do olho da cara
é aquela receita da avó
que dos indios herdou
os temperos vermelhos de outrora

Passado mais um pouco
uma casinha de frente pro mar
teve que dar lugar à uma buati
de grandezas e requintes
e o morador que pintara a mão
as janelinhas azuis de sua morada
que fora capitão de fragatada nas marés fortes
que tecia suas redes em seu quintal
que olhava fundo pro mar delicadeza
teve que abandonar seu posto

no dia em que viu que não seria possível viver
sem acordar com a areia branca
e com aquele barulho das ondas
vestiu seu uniforme
pegou a corda do barco
foi até a última castanheira
e se enforcou

depois de alguns anos
viemos saber que a buati
que matou o Capitão
que soterrou suas tarrafas
e sumiu com suas janelas azuis
fora construída com dinheiro público
e serve como lavagem de propinas
em um esquema de corrupção.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Do calor ao vento

Depois de passar alguns meses quentes na cama
se sujando de todos os fluidos corpóreos
a que um homosapiens ainda expele
e amando como um animal
sentimentos quase verdadeiros
não fosse o desabafo ofegante daquele dia
em que esfregou desesperadamente as maos, os braços e os calcanhares
procurando algum repouso no chão
fazendo nascer do sangue a vontade de muitos outros lugares



saia! rame flores em suas vertigens
olhe a praia deserta e o vento que fresca
em contraste com aridez vermelha que estivera
viaje e imagine que do outro lado do mar
algum como você sente a mesma coisa
mas fala outra lingua olha outro olho
e arrisco-me que tenha outro coração.


queria ser sempre a calma
onde a vegetação cresce dócil
a água ginga calma e a paisagem indiz

somos o contrário do futuro no mundo
versamos o passado
temos paraísos feitos a mão

Sinto-me cristalizado
grudado a grama
a fitar este lugar
pelo qual me apaixonara outra vez.

Numa coisa estranha que dá
aparece e some feito brilhos
e ali, desfeito como homem, chorara
debaixo do guarda-sol azul do céu
e do mesmo modo recobrando seus pilares de aurora
sorria, deixando as muitas coisas amorfas
se darem como flor, que vira fruto
que vira boca.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

O mar

De dentro do ônibus passeava

o olhar pelo tapete azul

com brilhos de diamantes

que lembravam os cabelos

de iemanjá


no fundo como um quadro

os pescadores radiavam sua

vitalidade

de quem aportou de mardugada

servindo de paisagem


lá longe

abri a janela

pros raios retinarem minha iris

e levar luz aos meu coagulos

pintar o íntimo jasmim

inebriado feito Camus

num mar de qualquer Argélia.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Chuva

a chuva me trouxe uma princesa

de iris melada e pele fria

embotada nos pingos dágua

molhado dos fios ao pés

acalentando as lagunas da cidade

o tempo de um dia

que acordava preguiçoso

com muros musgados verdes

e as árvores pingando lágrimas

ruas de ladrilhos mágicos

anjos de meias e pijamas em suas varandas

de casas de portaozinhos baixos

adornados brancos fazendo voltinhas infinitas

ela cantou e me embalou em seus braços

e me lançou feito um barco

em instantes de felicidade.